segunda-feira, 26 de maio de 2008

OS PREÇOS DOS COMBUSTIVEIS

Venho responder ao seu desafio de falar sobre os aumentos de preço da GALP.
Começo por dizer que não tenho acções da GALP. Aliás, não tenho acções de nada.
Também não tenho interesse directo em petrolíferas e, interesses indirectos acho que acabamos todos por ter, no mínimo como consumidores. A minha área é outra.
É impossível colocar um pouco de lucidez na discussão sobre os aumentos dos combustíveis, mais adiante direi porquê.
Como leitor fiel do seu blogue há muito tempo, um dos melhores, e por que sei alguma coisa do funcionamento dos mercados, permita-me os seguintes comentários:
As compras das matérias primas fazem-se essencialmente no mercado de futuros, que parto do princípio que sabe como funciona, basicamente em duas bolsas específicas, Londres e Nova York. Crude incluído. Os preços ditos de amanhã estão já a ser pagos hoje.
No caso dos combustíveis e, importa realçar o gasóleo, o caso fia mais fino.
Portugal, tal como a Europa, aderiu ao gasóleo e os refinadores europeus, GALP incluída, são largamente deficitários na produção de gasóleo.
De cada barril de crude destilado extraem-se vários refinados (apenas os principais - gás, gasolina, jet, gasóleo, óleos base, fuel, asfalto) em percentagens apenas elásticas em função do crude mais ou menos leve (light).
Quer isto dizer que não se pode tirar mais gasóleo e menos gasolina do crude (petróleo bruto), só porque o mercado escoa melhor um refinado em detrimento do outro.
O que acontece em Portugal, e por exemplo em Espanha (maior consumidor europeu de gasóleo)?
Da actividade refinadora da GALP sabe-se publicamente que não consegue escoar no mercado interno nem europeu, a gasolina (obrigatoriamente) obtida na refinação, pelo que exporta o excedente para os EUA, onde o mercado é exactamente o inverso do nosso, sendo deficitário em gasolina. E este parece um excelente negócio para a GALP e para o país por efeito da exportação.E agora o reverso da medalha. Onde vamos buscar o gasóleo que nos falta? Bem, principalmente à Rússia, que abastece praticamente toda a Europa. Em consequência da grande procura o gasóleo tornou-se escasso e principalmente objecto de grande especulação dos traders no mercado de Roterdão, que se estabeleceram como verdadeiros e poderosos intermediários.
Os Russos vendem a quem dá mais e não estão muito dependentes das grandes petrolíferas e, aqui está uma situação que estas não controlam, provando também um pouco do seu veneno, destilado noutras zonas do globo.
O preço (especulativo) do gasóleo tem aumentado muito mais do que o crude e, a verdade é que o preço actual do gasóleo ao consumidor não reflecte o seu custo nos mercados.
Até aqui pensou certamente que eu estava rendido às petrolíferas, mas agora é que a porca torce o rabo.
O que disse anteriormente acerca de o preço do gasóleo não reflectir o seu custo, aplica-se também à gasolina mas, neste caso, ao contrário.
O mercado da gasolina não exerce pressão inflacionista sobre os preços mas a realidade é que ela também aumenta, nomeadamente em Portugal. Porquê?
Porque o que está a acontecer é que o aumento inevitável do gasóleo está a ser “subsidiado” pelo aumento (mais moderado) da gasolina, travando ainda maiores aumentos do gasóleo.
Existem já três países europeus em que o gasóleo é mais caro que a gasolina e outros se seguirão.Agora perguntará porque esta situação não é claramente explicada e os “peritos” em hidrocarbonetos (revendedores incluídos) centram a discussão no aumento do barril de crude, afinal explicando muito pouco?
A questão é política.
Para o Governo: O impacto de maiores aumentos do gasóleo na economia seria ainda mais gravoso. Por outro lado, quem consome e paga a gasolina? Na realidade são os donos dos carros mais pequenos e menos caros, que, se soubessem, não iriam achar graça nenhuma a estarem a “subsidiar” os consumidores de gasóleo. São muitos, eventualmente mais débeis economicamente, e votam.
Para as petrolíferas: Embora havendo uma retracção do consumo dos combustíveis vendidos em estação de serviço (bomba), que já irá nos 7%, ainda seria pior se o gasóleo aumentasse ainda mais, porque essa é a maior fatia do mercado.
Embora não pareça, a “luta” dos revendedores é basicamente “show off”, porque sabendo que os preços têm de aumentar, preferem que aumente a gasolina, distribuindo o mal pelas aldeias, ou seja pelos produtos. Mas que cai bem ao resto do pessoal, lá isso cai.
O mercado é pouco transparente, como já se sabia. Os motivos para a pouca transparência é que serão outros.
Quando anteriormente disse ser impossível colocar um pouco de lucidez na discussão dos aumentos de preços do combustível, julgo que se percebe que isso não interessa.
Aceite os meus cumprimentos, expressando também a minha admiração pelo trabalho que certamente lhe dará a manter este blogue com a qualidade que lhe é reconhecida.»

Roubado ao jumento

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